http://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(16)00562-6/fulltext
A síndrome de Guillain-Barré é um distúrbio motor rapidamente progressivo associado à ausência de reflexos e ao aumento de proteínas no liquor, na ausência de pleocitose importante. A síndrome é variável em gravidade, e sua forma mais grave pode levar à paralisia respiratória e à morte. A polirradiculoneuropatia desmielinizante inflamatória aguda é o subtipo mais comum no mundo ocidental, caracterizada como uma patologia desmielinizante primária com vários graus de lesão axonal secundária.
Os sintomas sensoriais nas pernas geralmente marcam o início da doença, seguidos de fraqueza distal rapidamente progressiva que se espalha proximalmente. A dor lombar é comum e pode representar inflamação nas raízes nervosas. Pode haver ainda acometimento dos pares cranianos. O comprometimento respiratório pode ser súbito e inesperado, mas geralmente a capacidade vital cai de forma constante, e, assim, intubação e ventilação podem ser necessárias. Um pequeno número de pacientes desenvolve sinais incomuns, como papiledema secundário ao edema cerebral e hiponatremia. Distúrbio autonômico leve é encontrado em 3/4 dos pacientes, mas alguns desenvolvem bradiarritmias graves, as quais são reconhecidas como uma causa de morte pouco frequente. A mortalidade na maioria dos estudos de população é de 5 a 10%. A doença é monofásica, com a fraqueza atingindo sua maior gravidade em 4 semanas, seguida por uma fase de platô e, depois, recuperação. Cerca de 60% dos pacientes são capazes de caminhar sem ajuda após 12 meses; o restante pode ter vários graus de sintomas residuais.
Três quartos dos pacientes têm história de doença anterior – normalmente respiratória ou gastrointestinal, que pode ser leve ou completamente assintomática. A neuropatia começa tipicamente 7 a 10 dias depois de qualquer infecção. Inúmeros vírus podem estar associados com essa infecção inicial, e é aí que entra o vírus da zica. Entre 2013 e 2014, a Polinésia Francesa experimentou um surto importante da zica, e ao mesmo tempo aumentou o número de casos de síndrome de Guillain-Barré, levando então a possibilidade de uma associação entre o vírus e a síndrome. Essa possibilidade foi reforçada (porém não totalmente confirmada) por um estudo caso-controle publicado recentemente no periódico Lancet, no qual pesquisadores da Polinésia Francesa confirmaram a presença de anticorpos contra o vírus da zica em mais de 98% das amostras de 42 pacientes com síndrome de Guillain-Barré versus 56% dos pacientes do grupo-controle, os quais eram pareados com os casos por gênero, faixa etária e local de residência. Dos pacientes com a síndrome, 88% tiveram uma doença frustra 6 dias, em média, antes do quadro, o que seria compatível com infecção atual pelo vírus da zica. A necessidade de suporte ventilatório ocorreu em 30% dos casos e nenhum paciente morreu. Embora não seja novamente uma evidência definitiva, esse estudo se junta a outros relatos de caso que sugerem ser o vírus da zica uma causa potencial de síndrome de Guillain-Barré, e sua pesquisa deve ser realizada junto com a pesquisa de outros agentes em pacientes com a síndrome. Adicionalmente, esse estudo, junto com os relatos de aumento nos casos de Guillain-Barré no Brasil e em outros países da América, na vigência da epidemia de zica, sugere que devemos provisionar recursos de terapia intensiva para um possível aumento dos casos de Guillain-Barré. Devemos estar preparados!